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Mostrando postagens de julho, 2013

PRIORIDADES por Ruth Guimarães

PRIORIDADES por Ruth Guimarães  Ruth Guimarães Prioridades ou algumas razões para eu me passar para a crônica esportiva.  Pra quem não sabe, as reuniões do S.C. Corintinha são às quartas-feiras, nos fundos do bar do seu Manoel, presidente-sócio-fundador.  O presidente ocupa solenemente a cabeceira da mesa e a discussão começa.  -         Peço a palavra! -  diz um sócio, de cara fechada.  E desenrola a longa queixa:  -         Domingo vieram dois enxertos de Poá.  Para essa gente que vem de fora, é dinheiro, é lanche.  E pra nós que damos o sangue, daí a pouco estão cobrando.  Uma olhadela inamistosa para o lado do presidente, que se remexe inquieto.  -         Mas vocês compreendem... se não se agradar a essa gente, Oh! raios! Precisam compreender...  Alguém interrompe:  -         Eu vou falar...  -         Depois você fala.  E passam para o sempre atual problema do uniforme.  Jamais sobra dinheiro para comprar os sonhados calções pretos e, que diabo! o clube se chama Corintinha.  Não

PRIMAVERA por Ruth Guimarães

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Ruth Guimarães Li há muito em Joel Silveira: “uma esperança aos poucos vai ganhando tamanho no coração dos soldados. Trata-se da primavera. Na primavera aquela montanha fica toda verde, salpicada de flores vermelhas. Os rios voltam a correr e, na metade do dia, as suas águas são mornas. Virá o degelo que atolará os caminhos e sujará o mundo de uma argila negra. Mas, numa determinada manhã, uma flor terá nascido de uma lama ressequida e então será a primavera. Haverá sol.” Falava dos pracinhas brasileiros que, na campanha da Itália em buracos visguentos de lama, tiritando de frio, esperavam o sol. Talvez alguns entendessem, antes, de espera, vindos que eram de uma região que aguarda, na soalheira e no pó da terra calcinada, a benção da chuva. O que dá valor às belezas e excelências da vida senão o nosso desejo? De que serve a água para o que não tem sede? E o fruto para o farto? E o beijo para o indiferente? E o prazer para o saciado? Saciados estamos todos nós de flores e

Pescadores de tilápia parte 2 por Ruth Guimarães

  Pescadores de tilápia – 2  Ruth Guimarães  Pois eu contava que, na noite escura do rio assombroso, cada pescador deitou de bruços na pedra e esperou a hora – quando o rio dorme. Era tarde. O relógio da igreja tinha varado o coração do tempo com onze pancadas de bronze, sem poder quebrar o encanto. Foi quando o rio dormiu. Não se ouviu mais nem uma bulha. A água era óleo grosso, parado. Cada pescador, deitado de bruços, pegou a cutucar com a ponta do facão, embaixo do negrume de pedra, o cascudo negro, a nação de peixe mais feia que há. Parece um sapo. Parece um monstro ante-diluviano, em ponto pequeno. (Peixe e pedra cercados de um halo de prata.) Com a outra mão segurava um balaio, por baixo, para aparar o bicho. O cascudo é feio por fora e bom por dentro, como uma gente. É só sapecar na brasa, para arrancar a horrenda carapaça, e aparece a carne branca, diluente. Já não conto da fogueira, do cheiro do peixe bem temperado frigindo, do rio que recomeçou sua cantiga. Ninguém não viu m

Que poder tem o livro diante das armas! por Regina Rousseau

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Que poder tem o livro diante das armas! Assisti ao sábio discurso de Malala Yousafzai, que encarou a morte de perto de maneira tão estúpida pelo poder das armas, apenas por um único motivo:pegar seus livros, caneta e ir para uma escola estudar. Em quase todo planeta, é algo comum e rotineiro para as meninas da sua idade.  Porém, no seu país de origem é um crime que afronta toda uma tradição de exploração das mulheres. Por mais fanático que um terrorista possa ser, até na insensatez de se transformar em um homem bomba, ele sempre saberá do"perigo" que se esconde por trás dos livros, que o desperta do mundo fechado onde ele vive. Não sabe, por viver em um mundo escuro, sem conhecimento de sua realidade. Onde a sua ignorância também é explorada por quem apenas deseja o poder! O conhecimento é um constante trabalho de transformação humana, que somente a educação pode proporcionar dentro da sociedade como um todo. Onde não existirá lugares para exploradores, ditadores e extremista

Pensamenteando Raquel de Queiroz por Ruth Guimarães

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Pensamenteando Raquel de Queiroz Ruth Guimarães          Amor é jogo forte, só vale no tudo ou nada: amar é uma aventura heroica e insuperável, fora disso, tudo é perfumaria, amor suposto, talvez querer bem ou gostar – amar, nunca. Saiba ainda que, ao contrário do que se pensa, amor é coisa rara. Não é a todos que se apresenta a oportunidade de amar, nem se encontra a capacidade de amar em todos a quem a oportunidade se apresenta. É mister que se reúnam capacidade e oportunidade, ocasião e pessoa. Quanto ao objeto do amor – isso é somenos.           Se você ainda tem olhos para enxergar feiuras no seu suposto amado, se tem cabeça para lhe descobrir defeitos, é porque não ama. Se ele não lhe parece belo, irresistível, único – é porque não ama. Se por amor dele não está disposta a perder tudo, nome, fama, amor próprio, corpo, sangue, alma e divindade – então não ama.          Se qualquer homem do mundo, se qualquer outro homem lhe parecer mais bonito e mais interessante do que ele – entã

Para que se vestir por Ruth Botelho

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Para que se vestir Ruth Guimarães  Analisando rapidamente tudo quanto temos visto, chegamos à conclusão que por três motivos principais se usa a indumentária: para enfeite, por modéstia e para proteção. Há ainda um elemento que é mais ou menos como o perfume para a flor: um meio para atrair a atenção do outro sexo. Então a roupa é elemento de gala para época do namoro. E ainda podemos acrescentar o caso da roupa feita especialmente para aterrorizar, como mantilhas, enquanto as virgens usavam a cabeça descoberta e os cabelos soltos. Entre os egípcios, velhos e moços vestiam-se de modo diferente. Os reis  antigos usavam a púrpura e o cetro. Na China a nobreza usava seda, enquanto o povo apenas podia envolver-se em lã, linho ou algodão. Quanto aos enfeites, tribos mais atrasadas recorreram a cicatrizes, a tatuagens, a pinturas, à mutilação e a deformações, enquanto que, num estágio mais adiantado, vieram os colares, as plumas. As caudas, as pedras e anéis no lábio ou no nariz.           

Os sem-ofício por Ruth Guimarães

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Os sem-ofício Ruth Guimarães          Li um bocado nos jornais e fiquei inspirada a respeito de resolver ou não essa história de PAC e outros assuntos congêneres.  E essa balela de transformar a pobreza em classe média? Então o que estamos vendo é o treinamento do consumidor para o desfrute do inútil. Não parece que alguém esteja tentando diminuir a pobreza.  O próprio Cristo já dizia que nós teremos para sempre o pobre, o que não nos consola. A verdadeira pobreza é a falta de esclarecimento, a ausência do poder profissional e a não criatividade.  Com vistas a essa avaliação, não temos governo de pobre entretanto somos um povo de pobres.  Somos pobres vivendo enganados e confortavelmente em nossa pobreza em que nem acreditamos.  Tão doutrinados e apáticos, estamos tão bem em nossa inércia, que nos tornamos gordos e apáticos para sempre, sem luta, sem existir, como os porcos de Lobato em sua lama. O que é necessário combater? A satisfação do pobre dentro de uma pobreza patrocinada. O vo

Ode à minha terra por Ruth Botelho

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Ode à minha terra Ruth Guimarães Sou nascida em Cachoeira Paulista, estado de São Paulo, no Vale do Paraíba . Mas sempre considerei São Paulo o meu lugar. Minha terra de eterna primavera de onde não partem as andorinhas, e onde os sanhaços fazem túneis nos mamões e nas goiabas. As abelhas zumbem, traçando riscos de ouro no ar trêmulo e cheiram a mel quente de sol, bebida dos deuses, a fruta fermentando, perfume perturbador e violento, que embebeda e faz o pensamento derivar sem rumo, por desvios e curvas. Dá preguiça, gente. Uma preguiça coçada de bicho sem responsabilidade, que vive para agradar o corpo. O chão é  quente, escuro, dele sobe um bafo calorento. O Paraíba passa pelo meio da cidade, é uma prata no frio, óleo grosso, na chuva. Menino de beira-rio, por qualquer dinheirinho à toa, atravessa a nado aqueles cento e poucos metros, com alguma traiçoeira correnteza pelo meio, para lá e para cá. Menina sonha não sei o que, tem cheiro de fruta, tem pelo de fruta, vida agredindo por

MOÇOS por Ruth Guimarães Botelho

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MOÇOS Ruth Guimarães Primeiro li todos os jornais, mas todos, sem faltar nenhum, e depois fui ouvir o noticiário pelo rádio e minha alma ficou triste até a morte. E eis que esta é uma crônica de penitente. Penitencio-me de ter escrito um dia que o hino nacional da mocidade era o iê-iê-iê “Que vá tudo pro inferno”, de Roberto Carlos. É verdade que apontava como causa o nosso péssimo exemplo de mais velhos. Já Mário de Andrade, reconhecendo as belas qualidades da juventude, clamava: “O que fazem esses moços, que não se voltam para nós?” Pois aí estão os moços voltados contra nós, geração podre que lhes legou uma herança abominável. Geração que se lhes pôs diante, disforme e despudoradamente. Os professores universitários foram humilhados e ofendidos e eu não disse uma palavra. Houve cassados e caçados e eu não disse uma palavra. Sou o produto covarde de uma geração de covardes. A mim me preocupam o meu pão, o meu teto, o meu sossego, a minha respeitabilidade mesquinha, o meu emprego. Não